sexta-feira, outubro 06, 2006

Plataforma de Governo

Por Altamiro Borges.

Na sucessão presidencial deste ano, o debate programático tem ficado meio de escanteio. Na sua cruzada moralista, a mídia venal pouco tem falado sobre os graves problemas brasileiros e, menos ainda, sobre as propostas dos candidatos. A baixaria tomou conta da propaganda eleitoral de rádio e televisão. Na prática, somente a coligação "A força do povo", composta por PT, PCdoB e PRB, apresentou a sua plataforma de governo. A mídia preferiu desancar o texto, mais por suas lacunas do que por suas propostas. Acusou-o de ser genérico, de não se comprometer com as "inadiáveis reformas previdenciária e trabalhista" e de pregar o "aumento da gastança pública". Novamente, a mídia tenta pautar a política, substituindo os partidos.Desenvolvimento e empregos.
No que se refere à crucial questão do trabalho, a ausência de programas nítidos incomoda o sindicalismo. É como dar um cheque em branco para os presidenciáveis. O programa de Lula ainda tem um forte viés desenvolvimentista, apostando no crescimento da economia como fator indispensável para a geração de emprego e renda. Após criticar a "dupla herança negativa" - as duas décadas de estagnação e os efeitos destrutivos da política neoliberal de FHC -, ele faz um balanço positivo do primeiro mandato e apresenta algumas idéias-chaves para o futuro. De forma autocrítica, explicita que, apesar das mudanças, "caberá ao segundo mandato avançar mais aceleradamente no rumo de um novo ciclo de desenvolvimento".
No item sobre "trabalho e emprego", ele se compromete a "gerar mais e melhores empregos, por meio da expansão do investimento público e do estímulo ao investimento privado nos setores com maior potencial de criação de novos postos de trabalho; definir uma política de recuperação do poder de compra do salário mínimo; incrementar o crédito aos micro-empreendimentos, às cooperativas, às associações de pequenos produtores e a outras práticas de economia solidária". De forma preocupante, o programa também fala em "dar continuidade à democratização das relações do trabalho, com a aprovação da reforma sindical e a atualização da legislação trabalhista, com a garantia dos direitos fundamentais dos trabalhadores".
Comparação necessária
Comparativamente ao programa apresentado em 2002, que resultou na eleição de Lula, o de agora é mais genérico. Apesar do seu viés progressista, evita fixar metas concretas para a geração de emprego e renda ou assumir compromissos com avanços nas leis trabalhistas. O anterior explicitava a proposta de criar 10 milhões de empregos, dobrar o salário mínimo e reduzir a jornada de trabalho. O atual é mais abstrato, o que gera incertezas no sindicalismo. Exatamente por isso, as centrais têm evitado endossar acriticamente este programa e têm procurado apresentar suas propostas concretas para o segundo mandato. A CUT, por exemplo, aprovou a "plataforma democrática dos trabalhadores" com várias reivindicações específicas.
Um necessário balanço do atual governo, porém, evidencia o seu compromisso com o mundo do trabalho. Apesar de manter o tripé neoliberal - política monetária de juros altos, política fiscal de superávit recorde e libertinagem financeira -, é indiscutível que ocorreram avanços nesta área. Diferente de FHC, que baniu o sindicalismo - como na ocupação militar das refinarias na greve dos petroleiros -, o governo Lula criou canais democráticos de diálogo com os trabalhadores. Além disso, arquivou duas das principais medidas de precarização do trabalho orquestradas por FHC - a que impunha a prevalência do negociado sobre o legislado e a que ampliava a contratação temporária. Ele também congelou as terceirizações nas estatais.
Se é verdade que a meta de vagas não foi atingida, também é real que, nestes três anos, o governo gerou 4,2 milhões de empregos com carteira assinada, cerca de 120 mil por mês - 13 vezes superior à média de FHC. Quanto ao salário mínimo, seu valor nominal cresceu 75% - de R$ 200 para R$ 350. No início de 2003, ele comprava 1,3 cestas básicas; em maio de 2006, já equivalia a 2,3 cestas básicas. Junto com os programas sociais, estes tímidos avanços reduziram a miséria no país. Segundo o IBGE, a indigência caiu de 27,3%, em 2003, para 25,8%, em 2004 - ou seja, 3,2 milhões de brasileiros deixaram a condição de extrema pobreza. Nisto reside a força eleitoral de Lula, que a mídia, as elites e os sectários não entendem!

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